
Bom Ar
KPTL
Ah, o ar puro… Seja na paradisíaca Montana, nos Estados Unidos, palco da série premiadíssima Yellowstone, ou no imponente Monte Roraima, que fica na tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana, local de tomadas incríveis da novela Império, outra trama de grande sucesso do Grupo Globo, o ar por lá é sempre puro.
Mas nem todos vivem nesses verdadeiros sets de filmagem a céu aberto, onde a abundância de oxigênio faz qualquer pulmão estranhar a ausência de duas moléculas de carbono e uma de oxigênio, o famoso CO₂. Ou para os íntimos, gás carbônico.
Pelo contrário. A multidão, a massa, o grosso se acotovela mesmo é na Quinta Avenida, em Nova York, na Champs-Élysées, em Paris, na Avenida Brasil, no Rio de Janeiro ou na Avenida Paulista, em São Paulo. E ali falta ar… Ar de qualidade!
Portanto, respirou fundo nessas megalópoles, seus lindos pulmões vão se encher mesmo, além de oxigênio, claro, do mais puro gás carbônico, dióxido de enxofre, óxido de nitrogênio, além de poeira, fumaça, fuligem e mais uma gama de “amiguinhos” nada agradáveis à vossa saúde.
É por isso, e por mais uma calhamaço de argumentos, que a palavra da moda não é somente “delulu”, expressão abreviada de “delusional” – delirante em bom português. E que domina o universo Tik Tok especialmente quando aplicada de maneira humorística para mencionar expectativas irreais.
Não. Não é só “delulu”, não. É também o “palavrão” des-car-bo-ni-za-ção. Que convenhamos tem gosto, jeito e forma de trava-língua, e que vem ganhando manchetes de jornal à medida que nos aproximamos de novembro, quando a COP30 desembarca em Belém, no Pará.
“O que nós discutimos nesses dois “Vale rememorar o óbvio: o mundo enfrenta uma crise climática, fruto de um modelo de desenvolvimento iniciado lá na Revolução Industrial. E esse modelo tem um ingrediente perverso já na raiz, que são as emissões contínuas de gases de efeito estufa (GEE)”, lembra Renato Ramalho, CEO da gestora de fundos de Venture Capital, KPTL. “Os impactos globais dessa crise têm ficado cada vez mais evidentes ano após ano, reforçando a urgência de medidas de mitigação e a necessidade de compensar as emissões de CO₂”, acrescenta.
Renato Ramalho, CEO da KPTL. (Foto: Gil Silva)
Pois é, my dearest friend, a coisa está cinza. Cinza como um cinzeiro depois de uma tragada de nicotina e alcatrão.
Então, vamos combinar uma coisinha desde já. É bobo, mas vamos nos ajustar. Alô, Faria Lima, diga não ao “P-P-T”. Não ao Powerpoint, please! Porque a descarbonização merece mais. Merece, de fato, atenção aos detalhes.
Sim, detalhes. Porque para o money chegar lá na ponta, acelerando a transição para uma economia de baixo carbono, ou seja, sem àquela fumaceira de escapamento de ônibus e concreto em todo canto, é preciso de ação, de dinheiro na mesa. E não de PPT, right?!? Certo!
A Climate Policy Initiative (CPI), em seu levantamento, aponta que o fluxo de financiamento climático externo para o Brasil cresceu 84% entre os períodos de 2019–2020 e 2021–2022, passando de R$ 14,5 bilhões anuais para R$ 26,6 bilhões anuais. Isso representa um acréscimo de R$ 12,1 bilhões por ano.
Uma dinheirama nada desprezível. Mas… Há sempre um mas… Vamos a ele.
Mudas crescendo em uma pilha de moedas.
Só que esses recursos ainda são concentrados e chegam devagar em áreas que precisam de maior apoio, como bioeconomia e comunidades vulneráveis. Pior: especialistas alertam que há riscos reais de “greenwashing tropical”. Trocando em miúdos, recursos caminhando para projetos de manejo florestal em regiões sob forte pressão de ilegalidades, que no fim das contas são desviados para outros fins.
Nem seria necessário frisar, mas cabe aqui: isso pode virar um baita tiro no pé, né não?!?
A boa notícia, contudo, é que o Brasil está no radar global dos investidores que precisam “compensar” suas emissões. E buscam projetos de alto impacto.
Aqui, vem o pulo da onça pintada. Pay attention, please! O Brasil tem potencial para ser um modelo de mitigação climática impulsionado pela natureza. O mercado climático brasileiro, avaliado em mais de R$ 28 bilhões (preços de 2023), deve crescer 3,9 vezes até 2050, empurrado pela crescente demanda por soluções de carbono de alta integridade e avanços regulatórios. Em bom português: temos floresta, biodiversidade e tecnologia.
Detalhe – outra vez ele aparecendo por aqui. O que está impulsionando essa história não é só boa vontade. Podemos listar alguns fatores que explicam a expansão do mercado e ajudam a entender por que o Brasil está no centro do mapa.
Então, chegou a hora de papel e caneta à mão.
Regulação global em alta: em 2004, só 7% dos países tinham precificação de carbono; hoje já são 38%.
Transporte marítimo: navios acima de 5 mil toneladas, que respondem por 85% das emissões, agora precisam se adequar ou compensar.
Aviação internacional: com o SAF (combustível de aviação sustentável) ainda caro e escasso, o caminho mais viável para as companhias aéreas é a compra de créditos de carbono: 100 milhões a 150 milhões de créditos até 2026, podendo chegar a 1,5 bilhão de toneladas de CO2 até 2035.
Classe de ativos: os créditos de carbono já são tratados como uma classe de ativos distinta, com metas climáticas ambiciosas e oferta limitada.
Interoperabilidade do mercado: as fronteiras entre os mercados voluntário e regulado estão se dissolvendo, com mecanismos de integração em vários países.
Acordos bilaterais/multilaterais: esforços multilaterais, como a estrutura do BRICS, buscam mobilizar US$ 1,3 trilhão e integrar mecanismos financeiros e de mercado de carbono em todo o Sul Global.
O cardápio está aí, segundo a consultoria Street Research. Ou seja, não dá para alegar ausência de caminhos.
E a COP-30, hein?
Bom, primeiro que será em Belém, no Pará. Depois, vai rolar em novembro de 2025. E por fim, será uma oportunidade quase única de o “Bra-sil-sil-sil” mostrar se consegue transformar promessas em fatos. What challenge!
Mas vamos as boas novas. Vamos chegar à COP-30 com algumas boas notícias: a taxa oficial de desmatamento na Amazônia foi de 6.288 km² no período de agosto de 2023 a julho de 2024, o que representa uma queda de 30,63% em relação ao período anterior. É a maior queda percentual em 15 anos, segundo dados do sistema PRODES, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Além disso, 88% da matriz elétrica brasileira é renovável, com 24% vinda especificamente da eólica e solar fotovoltaica, conforme o Balanço Energético Nacional (BEN) 2025, do Ministério de Minas e Energia e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
Belém do Pará, sede da COP30.
No papel, parece boletim de aluno da primeira fila, os nerds, que estão fazendo a lição de casa, e só gabaritam. Mas não se pode relaxar. É preciso avançar.
Na Prática
É como diz o ditado, toda nota dez um dia foi lição de casa. E no Brasil, hoje, existem startups mandando bem e fazendo sua parte na questão da sustentabilidade, além de auxiliar na transição para uma economia de baixo carbono.
Um exemplo é a Future Climate, que atua como uma consultoria para projetos de geração de crédito de carbono, com foco em descarbonização. O trabalho da startup, que tem escritórios em São Paulo, Londres e Abu Dhabi, vai da criação e desenvolvimento do projeto, incluindo a aprovação da certificação, à gestão do projeto em si. “Nosso objetivo é levar o carbono para o balanço das empresas”, afirma Fábio Galindo, CEO da Future Climate.
“Já fizemos duas operações. E estamos conversando com bancos multilaterais para aumentar esse modelo de financiamento climático”, complementa Galindo. “A outra ponta são os contratos de longo prazo com grandes compradores de créditos e/ou investidores, que adquirem fluxo de carbono futuro (10/20 anos) e garantem receita recorrente para os projetos”, diz.
Fabio Galindo, CEO da Future Climate. (Foto: Divulgação)
Outra que tem feito a lição de casa é a Smartbreeder, startup de inteligência agronômica digital, que mostra como a tecnologia pode fazer diferença no campo, ajudando o produtor a tornar o manejo não só mais eficiente, mas também sustentável. A empresa integra Big Data, Inteligência Artificial, Satélite e ERP agrícola para automatizar decisões de manejo. Resultado: menos desperdício, maior consumo de insumos biológicos e aumento de produtividade sem precisar abrir novas áreas. A startup é comandada por Éder Gigliotti.
A empresa integra Big Data, Inteligência Artificial, Satélite e ERP agrícola para automatizar decisões de manejo. Resultado: menos desperdício, maior consumo de insumos biológicos e aumento de produtividade sem precisar abrir novas áreas. A startup é comandada por Éder Gigliotti.
Éder Gigliotti, CEO da Smartbreeder. (Foto: Divulgação)
Já são 3 milhões de hectares de cana monitorados (33% do mercado), mais de 115 usinas atendidas e expansão para o setor de grãos e fibras. É quase como colocar um Waze na agricultura: em vez de se perder no mato, o produtor recebe a rota certa para produzir mais e emitir menos. “Fazemos toda a integração dos dados, como informações para os ERPs agrícolas, dados de imagem de satélites, de máquinas. Integramos tudo isso num Big Data que aplica a inteligência agronômica para tornar o processo mais produtivo”, diz Felipe Ninni, diretor de desenvolvimento de negócios da Smartbreeder.
“Nosso principal pilar é a sustentabilidade. Nossa plataforma evita o desperdício de insumos. Além disso, estamos entre os grandes incentivadores do uso de produtos biológicos na agricultura. Esse tipo de produto exige mais cuidados na aplicação do que os químicos. O biológico exige critério, e nossa Inteligência Artificial ajuda muito nessa recomendação”, afirma Ninni.
Felipe Ninni, diretor de desenvolvimento de negócios da Smartbreeder. (Foto: Divulgação)
Paulo Dias, CEO da Ponta Agro. (Foto: Divulgação)
“A agenda da descarbonização é uma agenda muito importante que depende da integração de diferentes técnicas e tecnologias como a Integração Lavoura Pecuária (ILPF), recuperação de pastagens, melhoria de processos produtivos. O desafio aqui não é necessariamente tecnológico e sim de acesso às tecnologias e técnicas já acessíveis”, afirma Paulo Dias, CEO da Ponta Agro.
A empresa hoje é a maior companhia brasileira de tecnologia de precisão, gestão e inteligência de dados para pecuária com soluções integradas de hardware, software e informação. Com duas áreas de negócios – Unidade de Pecuária de Precisão e Unidade de Pecuária Intensiva – dedicadas a atender a pesquisa científica, o melhoramento genético e a produção comercial em 9 países. A Ponta tem ao redor de 70% do confinamento bovino no País.
O CEO da Ponta lembra que o Brasil possui o maior rebanho bovino do mundo com uma genética e tecnologias nacionais capazes de adaptar a produção às diferentes condições ambientais e temperaturas. “Ou seja, levar as tecnologias e o conhecimento disponíveis ao maior número de fazendas é um desafio de política pública. Para entender o tamanho desse desafio, hoje menos de 30% das fazendas têm balança de pesagem animal no curral. Para quem vende ganho de peso, esse é um item essencial e a maioria das fazendas ainda não têm”, afirma.
Message in a bottle
Como diz a música “Message in a bottle” da banda britânica The Police””
🎶I will send an S.O.S. to the world 🎶
Em tempo, não se trata apenas de S.O.S. Não! A regra está posta. Vamos à elas:
- É preciso manter o fluxo de recursos;
- Avançar na regulação;
- Encorajar a inovação.
Somente apostando nessa correlação de pontos, o Brasil vai deixar de ser “promissor”. E assumir de vez o papel de protagonista da descarbonização..
Mas até lá, prepare-se! A palavra des-car-bo-ni-za-ção vai aparecer tanto no noticiário quanto no happy hour da galera. A diferença é que, dessa vez, pode ser que o Brasil não esteja só ouvindo a história, mas escrevendo os próximos capítulos desse mercado.
“A natureza é o único livro que oferece um conteúdo valioso em todas as suas folhas”
Johann Goethe
3 perguntas para…
Marcelo Thomé
Diretor do Instituto Amazônia +21, Presidente da Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (FIERO) e Vice-Presidente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI).
Marcelo Thomé. (Foto: Divulgação)
1) Com a COP30 se aproximando e colocando o Brasil no centro das discussões globais sobre clima, que avanços concretos em descarbonização você espera ver liderados pelas empresas brasileiras?
Com a COP30, o Brasil tem a oportunidade de transformar compromissos em resultados concretos, liderando iniciativas de descarbonização que unam competitividade, inclusão e conservação. A expectativa é que as empresas brasileiras avancem em soluções integradas que combinem eficiência energética, bioeconomia e inovação tecnológica, criando cadeias de valor que contribuam para a agenda climática. No Instituto Amazônia+21, temos estruturado a Facility de Investimentos Sustentáveis (FAIS) justamente para atrair capital privado e internacional para negócios socioambientais que promovam descarbonização aliada ao desenvolvimento regional, gerando impacto real na região amazônica.
2) A descarbonização é um dos grandes desafios do setor privado. Como a Amazônia+21 / CNI estruturou sua estratégia para contribuir de forma efetiva nesse processo?
A estratégia do Instituto Amazônia+21 e da CNI está baseada em criar pontes entre empreendedores locais, grandes empresas e investidores, com foco em soluções que reduzam emissões e ao mesmo tempo promovam desenvolvimento sustentável. Um exemplo é o projeto Morar Amazônico, realizado em parceria com a CAIXA, que busca desenvolver modelos habitacionais sustentáveis para comunidades amazônicas, integrando tecnologias de energia renovável, materiais de baixo impacto e soluções adaptadas ao contexto da floresta. Esse tipo de iniciativa demonstra como é possível alinhar inovação, inclusão social e descarbonização, criando referências replicáveis para outros biomas.
3) O Brasil tem vantagens competitivas para liderar a transição para uma economia de baixo carbono. Que papel as grandes empresas brasileiras podem desempenhar nesse movimento global?
As grandes empresas brasileiras podem e devem assumir um papel de protagonismo, alavancando investimentos e inovações que acelerem a transição para uma economia de baixo carbono. O diferencial está em criar modelos que integrem a cadeia produtiva e gerem benefícios tanto para os mercados globais quanto para as comunidades locais. No âmbito da Facility de Investimentos Sustentáveis, buscamos justamente mobilizar esses atores para ampliar a escala de investimentos em bioeconomia, energia renovável e infraestrutura sustentável. Assim, as grandes empresas não apenas reduzem suas emissões, mas também fortalecem o posicionamento do Brasil como líder mundial em soluções climáticas justas e inclusivas.

